top of page

Força de vontade

Ah, essa é um clássico. De todos os modos sofisticados de falar sobre o quanto a mudança de comportamento é resultado de uma escolha e disciplina aplicadas a um objetivo, essa é a protagonista da história. Eu nunca me convenci muito com os discursos sobre força de vontade, mas quanto mais me aprofundo na literatura científica sobre tomada de decisão e auto-regulação, mais me convenço de que essa é mais uma explicação simplista, conveniente e reducionista pra não lidar com as complexidades inexplicáveis do porque fazemos o que fazemos. E que se torna um modo de persuasão convincente pra responsabilizar os indivíduos pelas derrotas de toda a sociedade #polemizei.


A verdade é que a literatura científica psicológica não abraçou esse termo, entre muitas razões, porque força de vontade, na concepção popular do termo, mais parece com uma entidade abstrata e difusa, aparentemente independente do ser que a possui, do que com um processo mental que podemos definir, mensurar e explicar. Contudo, outros conceitos como motivação e autorregulação tem uma definição mais precisa e contam com teorias mais sofisticadas pra explicar o autocontrole do comportamento.


O que essas teorias tem descoberto sobre a capacidade de autocontrole ainda é pouco incorporado às nossas percepções sociais sobre o tema. Basicamente, as evidências mostram que nossa mente tem um nível de energia limitado para aplicar no controle do comportamento, quando um nível de motivação suficiente está presente. Podemos exercitar e fortalecer esse controle de forma consciente, como num treino muscular, de forma que conseguimos agir de modo mais conscientes e decidir de forma mais direcionada. Mas isso não significa que podemos expandir nossa energia a níveis ilimitados. Basicamente, na ausência de uma motivação ou crença acerca de um objetivo, nosso cérebro entra no modo econômico, e basicamente vai fazer de tudo pra evitar aquele gasto de energia que ele acha desnecessário. Isso quer dizer que podemos até achar desejável um resultado, mas não haver as ferramentas mentais suficientes para alcançá-lo, seja porque não estamos realmente convencidos daquele objetivo, seja porque gastamos nossa energia com outras coisas no meio do caminho. Diante de múltiplos focos de controle, nossa energia geralmente vai ser gasta nas atividades que damos prioridade, de forma que as demais serão feitas com menos afinco ou dedicação.


Sabendo disso, quanto você acha realista esperar ter disciplina pra controlar o que come, quanto de exercício faz, quanto de tempo trabalha, quanto atualizado nos memes está, quanto de dedicação aplica a suas relações e a sua vida social, tudo ao mesmo tempo? E se gasta todas as suas energias em alguns desses, por que se cobra não dar conta dos outros? Antes de tudo, você tem certeza que está escolhendo conscientemente onde está gastando sua energia?


Camada_1.png
Maíra Blog.png

Maíra Colombarolli

Especializada em Neuropsicologia Clínica, Psicóloga por formação, pesquisadora por vocação.

bottom of page